quinta-feira, 14 de maio de 2020

Ei, não saiu mais post no blog, né?

Hoje, dia 14 de maio, faz exatos 2 meses que trabalhei o último sábado no ZipYard. Foi o dia do post da crise de ansiedade, o último dia que andei de trem, último dia que falei com a brasileira que eu não consigo gravar o nome que trabalha no restaurante do lado da loja.

Teve alguns posts que foram publicados depois desse dia, mas que foram escritos antes. Desde que tudo isso começou, a inspiração foi pras cucuias.

Lá se foram dois meses... Os dois meses mais esquisitos de toda a minha vida. E olha que já estou relativamente acostumada a viver em banho maria. Em 2015 decidimos que queríamos sair do Brasil, mas o Diego precisava terminar a faculdade. Em 2016 ele terminou e aplicamos pra loteria do visto dos EUA, fomos sorteados, ficamos em banho maria esperando o resultado, que levou alguns meses a mais que o esperado. Depois foi o visto pra Irlanda, depois outras coisitas nos deixaram em stand by.

Esperar, viver um dia de cada vez, não ter ideia sobre o que vai ser nos próximos meses, não poder fazer planos, enfim, deveria ser a minha especialidade, afinal, passei por isso tantas vezes nos últimos tempos.. Mas não. Não aprendi a lição ainda. E vou ter que aprender na marra junto com o mundo inteirinho. Não sou só eu que estou de molho. O mundo está. Os otimistas acreditam que tudo vai voltar ao normal daqui dois meses, os pessimistas acham que nunca mais vamos sair de casa.

"Uh, se a gente já não sabe mais rir um do outro meu bem, então o que resta é chorar.."

Não, essa música não tem nada a ver com a farofa, mas é que eu adoro essa música e ela tava tocando enquanto eu escrevia.. achei que devia compartilhar.. porque é assim que funciona minha cabeça..

Estou fazendo terapia toda semana e isso tem ajudado a manter as crises de ansiedade mais longe. Dias que leio sobre a situação do Brasil eu fico mais nervosa, dias que aparecem algumas notícias falando de crianças ou de pessoas da minha idade que morreram de COVID também são dias mais difíceis. Tento não pensar no risco dos meus pais pegarem. Ambos são grupo de risco. Viu? Coração já apertou. Por isso que tento não pensar.

Tenho tido sonhos malucos. Adoro desvendá-los com a minha prima e/ou com a psicóloga. Fiz cavaquinho várias vezes porque o Pablo gosta de fazer. Teve dias que não lavei nem um copo. Teve dias que capinei o quintal, hoje foi um deles.

Um dia arrisquei pegar a maquina de cortar cabelo e tosar a Fofinha que tava cheia de nós. Cansei, deixei pela metade. Sou ariana, gosto de começar as coisas. Só terminei no dia seguinte porque ela estava com nós. Mas a vontade era de sair correndo. Ela tá fedida. Mas odeio dar banho nela. Uma hora eu dou.

Comprei maquiagens, ainda não chegou. Não sei se vou ter paciência pra experimentar. Ainda mais não tendo lugar nenhum pra ir.

Passou meu aniversário, passou o do Lipe, passou o do Diego.. e agora espero pelo que? O do Pablo ainda faltam dois meses.

Como será que vai ser a vida daqui dois meses? Pelo mapa de reabertura do país, já vamos estar liberados pra ir pra lá e pra cá.. Mas vamos ter coragem? De nos expor pra dar uma passeada? Não temos carro, dependemos de transporte público. Era pra eu ter estudado pra carteira de motorista.. ter um carro nessa situação ajudaria bastante. Mas nenhum de nós dois tem carteira. E quem consegue aprender qualquer coisa nessa situação? 

Eu sei.. eu deveria usar esse tempo pra aprender italiano, fazer um curso de qualquer coisa.. mas não tenho vontade.. não tenho forças..

Essa foi a primeira semana que consegui com que o Pablo fizesse todas as atividades propostas pela escola, depois de dois meses. Enfim, essa é a vibe da quarentena..

Sou extremamente grata por poder estar em casa e cheia de saúde, mas isso não quer dizer que eu não esteja meio perdida e assustada com tudo isso. Seguimos.

domingo, 5 de abril de 2020

Desconstruída?

Outro dia eu assisti esse vídeo e fiz um comentário sobre como eu estava assustada com o rumo da conversa, mas que depois fiquei aliviada porque ele falava exatamente o que eu acredito. Então uma pessoa replicou meu comentário, dizendo que é engraçado como a gente se assusta quando encontra um ponto de vista diferente do nosso. E sim, ele tem razão. Como é difícil lidar com um ponto de vista diferente do nosso.

Eu lembro muito bem quando um amigo me criticou por reproduzir comentários vazios sobre o governo da época. Era uma pessoa próxima e eu não queria estragar a amizade por política. Fizemos um combinado, que ele teve que engolir na marra, de que não discutiríamos política jamais. E eu passei a odiá-lo internamente. Eu tentava abstrair aquele "problema" dele.

O tempo passou e eu conheci outras pessoas muito bacanas. E aquelas novas pessoas bacanas, defendiam pontos de vista muito parecidos com os daquele primeiro amigo. Foi então que finalmente eu me abri pra repensar o as minhas primeiras opiniões. "Mas como que tantas pessoas legais podem ser tão sem noção assim? Acho que tá na hora de repensar o que eu acredito como certo".

Eu posso dizer que foi ali, e só ali, que eu aprendi a questionar minhas próprias crenças. Mas confesso que foi relativamente fácil. "Nasci no meio de milhares de pinheiros, mas eu saquei que sou uma goiabeira". E eu encontrei as outras goiabeiras. Comecei a seguir todas e prestar atenção em tudo que elas compartilhavam. E tudo fazia muito sentido pra mim. Encontrei minha tribo. Eu tinha passado a vida repetindo os padrões, me sentindo desconfortável, mas repetindo, porque era mais fácil repetir do que questionar. E agora tudo fazia sentido e eu não estava louca. 

Hoje eu digo que quem conheceu a Carol há 6, 7 anos, não me conhece mais. Eu não seria amiga daquela Carol, não temos afinidade alguma. Eu precisei passar por ela pra ser eu. Mas foi relativamente confortável. Porque na verdade, eu só me encontrei mesmo. Essa parte não doeu, na verdade, tive a sensação de alívio.

Só que mesmo eu tendo passado por esse processo gigante de desconstrução, ou construção, sei lá.. a verdade é que eu ainda tenho muita dificuldade em lidar com pontos de vista diferentes dos meus. Eu sigo pessoas que pensam como eu, assisto videos de canais que compactuam com as minhas ideias, me afasto dos amigos que pensam diferente. E assim vou vivendo numa grande, nem tão grande, bolha confortável.

E sim, esse é outro texto pra mostrar minhas fraquezas.. sem muita conclusão.. só palavras soltas. Seguimos!!!

sexta-feira, 27 de março de 2020

O coração e a razão. Brasil em mim...

Esses dias me peguei deitada em posição fetal ouvindo pagode anos 90. Então levantei pra fazer algo, me olhei no espelho, olhei minha tattoo, meu cabelo, me curti, dancei um pouco, sambei fazendo a casa inteira tremer, quase que literalmente, porque a casa aqui treme a cada passo, imagina com pulinhos de uma pessoa desajeitada tentando sambar.

Fiquei ouvindo pagode uma hora, mais ou menos. Consegui me animar por um tempinho. Logo a angústia voltou e eu só não voltei pra posição fetal porque tinha que dar comida pros meninos, lavar louça, tocar a vida. A música mudou de pagode pra Nando Reis, Marisa Monte, sei lá.. Algo por aí. Acho que uns 99% do tempo que estou acordada e sozinha eu estou ouvindo música, 90% das vezes é música brasileira. Agora revisando o texto, estou ouvindo Ira.. "Eu tentei fugir, não queria me alistar. Eu quero lutar, mas não com essa farda".

Há algumas semanas uma amiga me convidou pra ir num bar que ia tocar MPB. A cantora não era maravilhosa e o repertório não era o meu preferido, mas de alguma forma, me senti em casa. Tenho a mesma sensação quando tomo guaraná ou como coxinha, tipo, essas nem seriam as minhas escolhas se eu tivesse no Brasil, mas quando sinto o sabor, tem gostinho de casa.

Ué? Mas não eras tu que não tinha a menor saudade do Brasil e morria de medo de ter que voltar? Sim, essa era eu. Eu, há um ano, dois, três. Não sou a mesma pessoa que eu era quando comecei a escrever esse blog. Vivi experiências que me transformaram. Muita água passou por baixo da ponte nos últimos três anos. Eu ainda tenho medo de TER que voltar, sem oficialmente ter ESCOLHIDO voltar. E essa foi uma das razões de termos mudado pra Irlanda, porque a situação era muito instável na Califórnia.

Nesses pouco mais de três anos fora do Brasil, eu só tive no Brasil uma vez, por vinte dias, sozinha, onde eu passei a maior parte do tempo dentro da UTI segurando a mão do meu pai e quando eu estava fora do hospital, eu estava angustiada com medo de perdê-lo. Voltei pra Irlanda sem ter visto meu pai acordado e ainda sem ter certeza que ele sairia de lá vivo.

Eu nunca fui pra visitar, passar férias, curtir, ir num show da Dbregas e/ou Dazaranha, comer o polvo no marisqueira de Sintra, tomar um vinho com as amigas ou comer um rodízio de pizza com muita pizza doce. Passei na minha casa só por cinco minutos, depois de ter ido na casa do pai, onde vivi outra experiência muito difícil, a de entrar na casa do pai sem ele lá, e sem ter certeza que ele voltaria. Graças a Deus, voltou :o)

Hoje, a Carolina que sou hoje, as vezes tem vontade de voltar. Tenho vontade de morar no Brasil depois de toda a experiência vivida. Depois de conhecer dois países diferentes, depois de viver culturas diferentes, depois de tudo o que eu aprendi, especialmente, depois de ver na prática que não existe país perfeito. Mas como diz minha psicóloga, isso é um desejo, quando o desejo passa a ser realidade, a gente passa a desejar outra coisa.

Percebi que o desespero de voltar diminui bastante quando tenho contato com o Brasil de alguma forma. Quando encontro brasileiras, que eu converso por horas sobre qualquer coisa, porque a gente simplesmente se entende. E não tem nada como falar o teu idioma, falar, verbalizar. Escrever, eu escrevo todo dia. Seja aqui, seja no meu diário ou no whatsapp. Mas falar.. Nossa.. como é importante pra mim gastar meu estoque de palavras falando meu idioma.

Então é isso.. esse post não tem muita conclusão.. é só meu coração, oscilando entre querer voltar e querer ficar. E assim vamos vivendo, um dia de cada vez... Tentando sempre viver o aqui e o agora, o que está "um pouco" mais difícil em meio a essa pandemia.

quarta-feira, 18 de março de 2020

O que eu amo e o que detesto do ensino secundário na Irlanda

Os meninos entraram na escola em abril e eu já fiquei sabendo que eu precisaria procurar escola pro próximo ano pro Felipe, já que ele estava no sexto ano, último ano do ensino primário na Irlanda. A pessoa que encontrou a escola pra gente foi super gentil e me deu as dicas, sugeriu que eu conversasse com o diretor pra perguntar quais as escolas os alunos deles iriam no próximo ano. Mandei email pra todas, e depois de saber quais tinham vagas, escolhemos a que gostamos mais. Era mista (meninos e meninas) e a religião não parecia ser muito o foco.

Antes de começar o ano letivo o Lipe teve três dias de integração, ele foi em um lugar com tirolesas, um parque aquático e um mini golf, achei super bacana, afinal, as crianças (que não são filhas de pais que adoram se mudar, claro) estudaram por oito ou nove anos na mesma escola e agora vão mudar pra uma completamente diferente. Achei acolhedor e um super começo.

As aulas começaram e eu achei as regras um pouco rígidas demais. Pra não falar absurdas. Se o Felipe chega um minuto atrasado, ele fica na detenção, ou seja, ele perde dez minutos do almoço dele como punição. Isso acontece se ele esquecer algum material, se eu não assinar o diário dele ou se ele fizer qualquer coisa fora das regras da escola. Como uma ativista da criação com apego e disciplina positiva, dá pra imaginar o que eu penso sobre esse tipo de punição, né?

Mas ok, o Felipe sofreu bullying uma vez, o carinha já vinha incomodando há um tempo, e o menino foi expulso da escola. Isso mesmo, expulso. Claro que antes de ser expulso, fica várias vezes na detenção, depois é suspenso algumas vezes e só então é expulso. O bullying com o Felipe foi a gota d'água. Eu acho ótimo que o menino tenha sido expulso e o Felipe não tenha que lidar com ele todos os dias, mas poxa.. Será que alguém cuidou do bully? Será que alguém olhou pra ele e tentou entender o porquê desse comportamento? Ok, essa parte eles ficam devendo.

O Ensino é tradicional, mas eu já esperava. Tem pouca participação e menos mão na massa do que eu considero ideal, voltamos pro esquema que o professor é autoridade e o aluno só escuta. A escola do Felipe não é uma escola que a galera gosta muito. Academicamente não é uma das mais fortes, mas como já falei em outro post, não é meu foco com escolas, por mais estranho que possa parecer.

E agora a surpresa! Frequentemente o Felipe me conta que não teve aula tal porque o professor não foi. Sim, faltam professores. Em fevereiro teve até greve. Sim, meus senhores, estou na europa e faltam professores nas escolas públicas também. Nenhum lugar é perfeito. Aqui os professores também não são valorizados como deveriam.

Mas vamos falar de coisas boas? Eu amo o fato de ter uma bandeira arco íris na frente da escola e de eles dedicarem tanto tempo pra conversar sobre a comunidade LGBTQ+ (me perdoem se esqueci alguém) e lembrar as crianças que elas são aceitas ali. E isso é tão mágico que dois colegas do Felipe já se identificam aos 12 anos como bi. Vocês podem imaginar que coisa mais linda? Que meu filho estuda numa escola que ele sabe que ele pode ser quem ele quiser, porque ele sabe que lá ele será aceito de qualquer forma? Eu morro de orgulho e eu não sei se isso é algo da Irlanda ou da escola do Felipe, mas eu sou grata por ele estar onde está.

Diversidade. Sim, na escola do Lipe também tem gente do mundo todo e isso é tão rico, nem tenho palavras. E já que estamos falando em diversidade, preciso contar que nas aulas de religião eles aprendem sobre comunidade e as principais religiões. Eles aprendem um pouco de cada e como respeitar uns aos outros. Essas coisas pra mim, sinceramente, não tem preço.

Mesmo que seja de forma tradicional, eu fico muito feliz de saber que no currículo da escola tenham as matérias política em sociedade e saúde em sociedade. Ele também tem artes, business e francês. (Ele poderia ter escolhido economia do lar, música ou marcenaria). E quando ele tiver no senior cycle, que são os três últimos anos, creio que equivalente ao ensino médio no brasil, ele vai ter educação sexual e sobre relacionamentos. Sim, faz parte do currículo.

Além de todas essas coisas legais, ainda tem alguns mimos que eu acho fofos, tipo, eles mandam pelo correio um cartão postal (com artes dos alunos dos anos anteriores) elogiando o desempenho nas atividades, elogiando que ele ajudou o professor tal, elogiando isso e aquilo. Eu acho fofo. E também, se participar do clube dos deveres que tem depois das aulas todos os dias da semana, na sexta feira eles ganham um “chicken roll” na sexta feira, que é basicamente um pão com nuggets.

Ah, quase ia esquecendo que eu amo o tanto que eles estimulam a escrita e a arte de maneira geral. A
escola é cheinha de obras dos alunos que estudaram lá antes. Eu acho muito legal, afinal, o Lipe adora desenhar e ele ta podendo explorar esse dom na escola, e claro que eu adoraria que ele gostasse de escrever do jeito que eu gosto.

Depois de ter esse texto prontinho, teve uma reunião de pais, que eu não posso deixar de compartilhar. Quando cheguei na escola estava o Felipe, oferecendo chá e biscoitos, que os amigos dele estavam servindo. Do outro lado, funcionárias com a lista de professores de cada aluno e alguns alunos entregando canetas. Dentro da biblioteca, os professores sentados em círculo, com placas com seus nomes. Os pais foram de professor em professor, até completar toda a lista, ouvir o que eles tinham pra falar sobre os nossos filhos. Eu achei muito aconchegante. Todo aluno importa pra eles. Na Califórnia, depois que vai pro "middle school" só tem reunião com professores se teu filho causa problemas. Oi?! Ir nessa reunião me trouxe um calor gostoso no coração. Os professores não falaram só das notas do Felipe, eles falaram sobre o Felipe como ser humano, muito além de "é comportado".

Confesso que eu termino esse texto bem feliz. Ultimamente eu venho me perguntando “o que que eu tô fazendo aqui?” e depois de escrever, escrever e escrever… eu já tenho as respostas. Obrigada por me ler até aqui :o)

sábado, 14 de março de 2020

COVID-19 feelings - Texto escrito durante uma crise de ansiedade

Coceira no nariz, bosta, não lavei as mãos. Aguenta!! Coceira no olho. Não toca, não toca, não toca. Espera poder lavar as mãos. Droga, desequilibrei no trem, precisei segurar. Merda, não da pra sair do trem sem apertar a porra do botão verdinho que ta piscando. Calma, Carolina, tem bem menos pessoas circulando na rua, bem menos chance de contagio. Carolina, tu sabes que esse virus não é tão preocupante na tua idade. Mas a psicóloga falou que ouviu que não sei quem disse que a pior faixa e dos 30 aos 50.

Péra, péra, péra.. tu não leu isso em lugar nenhum. Tu sabes que a tua psicóloga tá mais assustada que
tu. Mas e se eu e o Diego pegarmos juntos e precisamos ser internados? Quem fica com as crianças? Calma, Carolina.. Não pira!!! Mas e se o pai ou a mãe pegarem no Brasil? Eles estão no grupo de risco. Ah, calma.. a mãe nem sai de casa, só vai da casa dela pra casa da Rê.. mas a Rê trabalha com comércio e atende um monte de gente por dia, ela pode levar o virus pra mãe.. Ufa.. pelo menos vi que o pessoal na casa que o pai mora ta usando máscaras.. Ufa de novo.

Sogro e sogra ligam! Vocês querem voltar pro Brasil? Vocês podem morar no apartamento em
Itapema. Calma, gente!! Não precisa se assustar.. tá tudo bem!!! Só tá faltando comida no mercado porque o povo tá maluco. Sogro arregala os olhos do outro lado da tela. Relaxa.. nós temos comida pra dez dias e já programamos a próxima compra online.

Mas e o nosso passeio pra Amsterdam? Será que vamos ter que cancelar? É óbvio que vamos. Mas continuo na esperança de que o vôo seja cancelado pra gente não perder tanto dinheiro. E essa dor no meu dente quando passo fio dental logo agora, não tinha outra hora pra acontecer? E se eu demorar muito pra marcar consulta e não tiver mais dentista aberto pra me atender e começar a doer mais? Marca consulta de uma vez. Ok, marcado, mas também tenho medo de dentista. Respira, Carolina. Não pira.

Chego no trabalho e vejo a placa dizendo que a loja não abre segunda (terça é feriado) e que quarta feira vai atender em horário reduzido. Mando mensagem pra chefa. Chefa? Vamos reduzir horário? Provavelmente vamos fechar. Mas não queria tomar essa decisão sozinha, tô esperando o governo mandar fechar. Mas tô achando que vou fechar de uma vez. Se tu tiver muito assustada, me fala que eu te cubro e tu vai pra casa. Não quero que te sintas desconfortável. Ue.. Desconfortável eu já estou. Em casa vou enlouquecer.

Fui no mercado comprar papel toalha e papel higiênico pra loja, senti olhares de julgamento. O mesmo olhar que eu faria ao ver pessoas com pacotes de papel higiênico por ai. Ainda não entendi a lógica de estocar papel higiênico. Mas na dúvida, comprei um pacote extra pra loja. Hahahahahahaha.

Eu estava tão feliz de ter amigos pra comemorar meu aniversario esse ano. Será que daqui um mês eu vou poder ver gente de novo? Abraçar pessoas. Beijar??

Atendi a primeira cliente agora. Depois de uma hora e dez de loja aberta. Ela abriu a porta com o cotovelo. Na hora de sair, ficou por um segundo pensando como puxar a porta sem tocar. Ofereci álcool em gel. Eu não queria dividir o pouco que tenho, mas né? Ela disse, não precisa, tenho no carro. Ufa. Meu resto de álcool vai durar um pouco mais. Droga. Toquei o mouse e o teclado depois de atender ela e antes de passar álcool em gel. E agora? Relaxa, Carolina. Credo.. que louca!!!

+-*69/58 <= Isso fui eu limpando o teclado. Respira fuuuuuundooo!!!! Pronto. Estou 70% mais calma depois de colocar isso mais fora. O Coração ainda está apertado. Mas ok.

Tudo isso que relatei acima e só dentro da minha cabeça. O lado racional e o lado que esta em pânico tentando conversar. Dentro da minha bolha. O coronavirus trouxe uma baita duma crise de ansiedade em mim, e fato. Eu sei que temos risco de contágio, mas que a probabilidade de se tornar algo grave é bem baixa. O medo não e do virus em si. E do caos. O pânico generalizado me afetou. SIM! Por mais que eu saiba, racionalmente que não deveria me desesperar.

A nossa realidade é muito mais tranquila que a de MUITA gente. Temos o privilegio de o Diego poder trabalhar de casa. Temos o privilegio de meu salário ser somente uma parcela pequena do nosso orçamento e o fato de eu ficar sem trabalhar não vai ter um impacto muito grande na nossa vida. Mas a realidade lá fora é que MUITA gente trabalha por hora. Se trabalha, recebe, se não trabalha, não recebe. Como paga as contas? Como compra comida?

Escolas e creches fechadas, quem precisa sair pra trabalhar, vai precisar pagar alguém pra cuidar das crianças. Não adianta adotar os filhos dos amigos que precisam trabalhar, tem que evitar muita criança junta. Criança quase não tem sintoma, mas transmite pro amiguinho que vai visitar o vovô e aí já viu...

A recomendação é não visitar os velhinhos. Nas casas de repouso já está proibido antes de fecharem as escolas. Mas como vão ficar os velhinhos solitários nas suas casas? Quem vai cuidar do emocional dos velhinhos que não são habituados a usar a internet. Como vamos cuidar do nosso emocional? De todos nós que estamos passando por tudo isso que é completamente novo. Desacelerar. Não ter contato com pessoas. Tempos sombrios. Tempos estranhos.. Sobreviveremos. Que lição será que a humanidade tem que aprender sobre isso tudo?

Sei que temos muito o que aprender aprender. Mas nesse momento, so queria contar que enquanto eu digitava isso, vi uma mulher abrir um pacote de cigarro e "deixar cair" no chão, assim, desse jeito que me deu vontade de atravessar a rua e fazer ela engolir a porra do plástico (sim, e isso que eu sinto todas as vezes, mas costumo fingir sanidade).

Escrevi esse texto do trabalho, durante uma crise. Reli agora, enquanto colocava os acentos e eu mesma lendo esse texto, penso: que exagero!!! Mas é a mais pura maluquice que passa dentro da minha cabeça nos momentos que a ansiedade ataca. Esse texto não teve bem um começo, ou meio, ou fim.. mas seguimos juntos, a uma distancia segura, por favor, por mais que tudo que eu precise agora seja de um abraço.

quarta-feira, 11 de março de 2020

Pedacinhos de felicidade na Irlanda


Vamos falar da parte meio cheia do copo? Eu poderia falar de poder de compra, de segurança, da simpatia dos irlandeses. Mas isso todo mundo fala. Eu quero falar dos pedacinhos de felicidade que EU encontro todos os dias ou de vez em quando.

Não sei se alguém reparou o nome do blog, mas tentei um monte de coisa que sugerisse viver pelo mundo e todos estavam ocupados, então chutei os dois bichos que eu mais tenho fascínio por aqui e funcionou, então fica assim mesmo. Eu nem sei porque gosto tanto desses bichos. Mas eles despertam algo legal em mim.

O Magpie eh um pássaro da família dos corvos e dizem que se você não falar “hello, mister magpie” quando encontra um, você terá azar. Eu sempre amei gatos pretos e acho que isso tem a ver com o meu lado bruxa, da conexão com a natureza, a intuição, enfim. Eu simplesmente AMO o magpie e cumprimento ele só porque gosto dele mesmo. De maneira geral, a Irlanda tem muitos pássaros lindos. Eu amo todos eles. Eles me trazem alegria todos os dias.

Já as raposas me trazem um certo medo, mas é um medo bom, não sei explicar. Eu queria ser amiga delas, mas elas me encaram de um jeito que eu paraliso. No verão elas adoravam passear pelo meu quintal, sempre com os olhos fixos em mim, me da frio na barriga, fico imóvel, mas morro de vontade de me aproximar, apesar de achar que não seria uma boa ideia. Nas noites de lua cheia elas fazem muito barulho e eu googleei e descobri que e porque as noites de lua cheia são mais iluminadas e então elas saem pra caçar. Os barulhos que elas fazem são para comunicação.

O fato de os dias serem curtos faz com que eu tenha muito mais oportunidade de observar as estrelas. Como não tem muita luz por aqui, dá pra ver muito mais estrelas do que eu via no Brasil ou na Califórnia. O problema é que dias que não estão nublados são MUITO mais frios que os dias nublados, então falta coragem pra ficar na rua muito tempo. Mas eu amo mesmo assim. A parte chata é que no verão não fica noite, noite. Então por alguns meses não dá de ver estrela alguma.

Falando em dias curtos e longos, eu não lembro quando tinha sido a última vez que presenciei um
nascer do sol antes de me mudar pra cá. Como no inverno o sol nasce oito e tantas da manhã, eu já estou na rua, a caminho da escola e isso me dá o presente de presenciar os nasceres do sol mais magníficos de toda a minha vida. Agora o sol já está nascendo antes de eu sair de casa, mas sei que no próximo inverno serei presenteada de novo.

Como os dias aqui são super malucos, costuma chover e dar sol várias vezes durante o mesmo dia, é muito comum nos depararmos com arco íris. Eu sempre fui apaixonada por eles e eu SEMPRE fico feliz quando vejo um, então quanto mais vezes eu vejo, mais vezes eu fico feliz.

Mas e essa louca da natureza? Tem coisas que não são relacionados a natureza que trazem felicidade na Irlanda? Teeeemmm… Bebês fofos e encapotados. Gente, eu simplesmente não consigo não achar suuuuuper fofo os bebês de todos os tamanhos no carrinho, cheinho de roupinhas e touquinhas e luvinhas. Numa boa!!! Eu não sei dos bastidores, não sei como é encher um bebê de roupa e a briga que é. Mas ver eles na rua assim, vivendo numa boa e não, eles não estão todos ranhentos como vocês podem estar visualizando, sempre acho fofo e mentalmente faço “aaawwwnnnn”. Acho muito legal como as pessoas simplesmente vivem no frio e não necessariamente ficam presas dentro de casa ou doentes a cada ventinho que pegam. Só pra constar, eu ainda fico doente mais do que deveria, mas já sou bem mais resistente do que era no Brasil.

Outra coisa que eu adoooooro é a simplicidade do chá e biscoito. Eu era acostumada com a cultura brasileira, onde comemos pra caramba e toda a socialização gira em torno da comida, e está subentendido que se tu convidares alguém pra tua casa, isso vai exigir um certo empenho em preparar algo pra receber a pessoa. Coffee break em algum curso? Normalmente recheado de comida. Comida, comida, comida! Por aqui é diferente. Adoro a simplicidade. Podemos ter conversas de horas tomando um chá e comendo um biscoitinho simples, tipo bolacha maria ou de leite. Acho prático e ao mesmo tempo acolhedor.

Pra finalizar, vamos falar de música. Infelizmente onde eu moro só tem um cara tocando ave maria no violino quase todo santo dia. No natal tinham pessoas tocando jingle bells com um trompete e teclado, era muito divertido. Mas de maneira geral, nos lugares mais turísticos sempre tem música, sempre tem alguém tocando alguma coisa e a vibe e super gostosa. De vez em quando rolam até uns brasileiros tocando samba, o que é bem gostoso.

Essas pequenas coisas me trazem alegria todos os dias. E claro que, como todo ser humano, tem dias em que não é tão fácil olhar a parte meio cheia do copo. Tem dias que eu sei que vai ter arco íris, mas não tenho vontade de sair pra rua pra procurar. Tem dias que não tô afim de chá e biscoito e tudo o que eu queria era um pão de queijo com chocoleite. Mas assim é a vida, né? Todo copo tem sua parte cheia e sua parte vazia. E tá tudo bem oscilar entre curtir a parte cheia ou lamentar a parte vazia.

quarta-feira, 4 de março de 2020

Eu amo a Irlanda, maaaaasss...


Quando a gente pensa em mudar de país, a gente procura se informar o máximo possível, pesquisa, procura blogs, entra em canais no youtube, procura pessoas que moram no local há mais tempo e tudo mais. Mas de maneira geral, as pessoas tendem a compartilhar as partes boas. Poucas pessoas postam as partes ruins. E claro, é um jeito bacana de viver a vida, sempre olhando o copo meio cheio, maaaaaasss. É preciso ter consciência que o copo também está meio vazio. Não, não estou dizendo pra olhar somente pro copo vazio, mas ter consciência que todo copo tem duas metades nos faz tomarmos decisões mais conscientes. Afinal, como eu repito sempre, cada escolha, uma renúncia.

Pois então, seguimos as minhas percepções, frustrações, ilusões, mas também coisas que não são tao ruins como eu imaginava.

Cocô de cachorro. Misericórdia. Aqui não tem cachorro de rua, então não da de botar a culpa nos coitadinhos. A multa pra quem não limpa o cocô do cachorro é de 150 euros. Mas quem fiscaliza? Acho que ninguém, porque em todo lugar tem muito cocô de cachorro e a gente tem que andar sempre cuidando pra não pisar. Acho uma baita falta de respeito dos donos dos cachorros.

Pessoas que atravessam fora da faixa e motoristas que não param pra quem está esperando pra atravessar na faixa. Esse assunto é longo. No Brasil eu já me irritava bastante com isso, mas depois eu me acostumei com a Califórnia, onde de maneira geral, as pessoas são bem respeitosas com pedestres que pretendem atravessar na faixa. Inclusive, se tu estivesse em uma esquina, seria melhor não “parecer” que queria atravessar a rua, se não, os carros iriam parar. Na verdade, se você for visto atravessando fora da faixa pela polícia, você pode ser multado.

Mas e na Irlanda, minha gente? Bom, na Irlanda eu diria que em torno de 10% das pessoas atravessam na faixa. Normalmente eu sou uma das únicas “idiotas” que fica esperando o sinal abrir pra poder atravessar, ou que dá a volta ao mundo pra poder atravessar na faixa. Eu entendo, em partes. As sinaleiras demoram MUITO pra abrir. Enche o saco, eu confesso. Mas ainda assim, eu prefiro fazer certo e esperar abrir, com excessão da faixa perto de casa que está com defeito e simplesmente não abre nunca se não tiver passando carro, mas me sinto uma criminosa cada vez que atravesso com o sinal de pedestres vermelho.

Os motoristas que não param pra quem esta esperando pra atravessar e infelizmente não posso reclamar muito, já que a lei de trânsito irlandesa só exige que o motorista pare se o pedestre já tiver iniciado a travessia. Então é raríssimo alguém parar pra gente atravessar quando estamos esperando, ok, estão perdoados. Mas ainda fico chateada.

Lixo no chão. Bah, outra coisa que eu acho super triste. Apesar de sempre ter o carrinho varrendo o chão e limpando as ruas, ainda assim, tem muito lixo pelas ruas e também no trem e ônibus. Infelizmente, é completamente comum ver as pessoas abrindo um pacote de qualquer coisa e “deixando o papel cair”, assim, como se fosse a coisa mais natural do mundo. Um dia eu estava numa festinha com o Pablo e vi as crianças abrindo pirulitos e jogando o papel no mar, e achando o máximo ver o papelzinho voar pro mar. Falta conscientização nas escolas, falta conscientização de maneira geral. Me dói a alma. Em determinadas épocas da vida eu me obrigo a juntar três lixos que encontro no chão por dia. Em determinadas épocas eu tento fingir que não vejo. Mas eu vejo, e conversei nas duas escolas pra fazer campanha de conscientização, porque as crianças podem mudar o mundo. Tomara que tenham me escutado.

Ah, eu quase ia esquecendo de comentar. A maioria das pessoas fuma. Imaginem o choque que eu levei quando fui matricular o Felipe no ensino secundário e dei de cara com um monte de criança (de uns 14, 15 anos) fumando. Nem no Brasil e nem na Califórnia as pessoas fumam desse jeito e infelizmente, ate os meninos já se acostumaram com o cheiro, que há um ano atrás eles não conseguiam suportar. Mas, paciência, né? Espero realmente mesmo que os meus filhos consigam se manter longe do cigarro.

A chuva e o frio. Pois geeeente… isso era o assunto mais falado quando eu procurava sobre pontos negativos da Irlanda. E juro, não eh tãaaaao horrível assim. Claro que morro de saudades de sentir calor, usar um vestido e exibir minhas tattoos lindas de viver, mas a gente se acostuma. A chuva não eh tao horrível como dizem. É raro chover forte. É uma garoazinha, normalmente, que nem vale a pena abrir o guarda chuva. Melhor é ter uma jaqueta a prova d'água, tênis a prova d'água e ser feliz. 

O corpo se acostuma e a gente comemora quando da mais de dez graus, porque esta “quente”. A gente se habitua a vestir cachecol, touca e um monte de blusas e tirar tudo a cada lugar que entra, pois tem aquecimento em todo lugar. Simplesmente faz parte da nossa vida. Eu não uso mais bolsa, por exemplo. Uso mochila (a prova d'água, claro) com um kit sobrevivência que inclui água, cachecol, touca, luva, álcool gel e todas as outras coisas que a gente carrega na bolsa.

A Irlanda eh ruim? Mas eh óbvio que não. Se fosse ruim, eu não estaria aqui. E é claro que vai rolar post sobre o que eu gosto daqui também. E talvez as coisas que me incomodam aqui, não vão te incomodar. Do mesmo jeito que voce pode talvez nunca se adaptar ao frio. Os países são diferentes, as culturas são diferentes e principalmente, as pessoas são diferentes. Essa eh a graça da vida, não achas?