quarta-feira, 18 de março de 2020

O que eu amo e o que detesto do ensino secundário na Irlanda

Os meninos entraram na escola em abril e eu já fiquei sabendo que eu precisaria procurar escola pro próximo ano pro Felipe, já que ele estava no sexto ano, último ano do ensino primário na Irlanda. A pessoa que encontrou a escola pra gente foi super gentil e me deu as dicas, sugeriu que eu conversasse com o diretor pra perguntar quais as escolas os alunos deles iriam no próximo ano. Mandei email pra todas, e depois de saber quais tinham vagas, escolhemos a que gostamos mais. Era mista (meninos e meninas) e a religião não parecia ser muito o foco.

Antes de começar o ano letivo o Lipe teve três dias de integração, ele foi em um lugar com tirolesas, um parque aquático e um mini golf, achei super bacana, afinal, as crianças (que não são filhas de pais que adoram se mudar, claro) estudaram por oito ou nove anos na mesma escola e agora vão mudar pra uma completamente diferente. Achei acolhedor e um super começo.

As aulas começaram e eu achei as regras um pouco rígidas demais. Pra não falar absurdas. Se o Felipe chega um minuto atrasado, ele fica na detenção, ou seja, ele perde dez minutos do almoço dele como punição. Isso acontece se ele esquecer algum material, se eu não assinar o diário dele ou se ele fizer qualquer coisa fora das regras da escola. Como uma ativista da criação com apego e disciplina positiva, dá pra imaginar o que eu penso sobre esse tipo de punição, né?

Mas ok, o Felipe sofreu bullying uma vez, o carinha já vinha incomodando há um tempo, e o menino foi expulso da escola. Isso mesmo, expulso. Claro que antes de ser expulso, fica várias vezes na detenção, depois é suspenso algumas vezes e só então é expulso. O bullying com o Felipe foi a gota d'água. Eu acho ótimo que o menino tenha sido expulso e o Felipe não tenha que lidar com ele todos os dias, mas poxa.. Será que alguém cuidou do bully? Será que alguém olhou pra ele e tentou entender o porquê desse comportamento? Ok, essa parte eles ficam devendo.

O Ensino é tradicional, mas eu já esperava. Tem pouca participação e menos mão na massa do que eu considero ideal, voltamos pro esquema que o professor é autoridade e o aluno só escuta. A escola do Felipe não é uma escola que a galera gosta muito. Academicamente não é uma das mais fortes, mas como já falei em outro post, não é meu foco com escolas, por mais estranho que possa parecer.

E agora a surpresa! Frequentemente o Felipe me conta que não teve aula tal porque o professor não foi. Sim, faltam professores. Em fevereiro teve até greve. Sim, meus senhores, estou na europa e faltam professores nas escolas públicas também. Nenhum lugar é perfeito. Aqui os professores também não são valorizados como deveriam.

Mas vamos falar de coisas boas? Eu amo o fato de ter uma bandeira arco íris na frente da escola e de eles dedicarem tanto tempo pra conversar sobre a comunidade LGBTQ+ (me perdoem se esqueci alguém) e lembrar as crianças que elas são aceitas ali. E isso é tão mágico que dois colegas do Felipe já se identificam aos 12 anos como bi. Vocês podem imaginar que coisa mais linda? Que meu filho estuda numa escola que ele sabe que ele pode ser quem ele quiser, porque ele sabe que lá ele será aceito de qualquer forma? Eu morro de orgulho e eu não sei se isso é algo da Irlanda ou da escola do Felipe, mas eu sou grata por ele estar onde está.

Diversidade. Sim, na escola do Lipe também tem gente do mundo todo e isso é tão rico, nem tenho palavras. E já que estamos falando em diversidade, preciso contar que nas aulas de religião eles aprendem sobre comunidade e as principais religiões. Eles aprendem um pouco de cada e como respeitar uns aos outros. Essas coisas pra mim, sinceramente, não tem preço.

Mesmo que seja de forma tradicional, eu fico muito feliz de saber que no currículo da escola tenham as matérias política em sociedade e saúde em sociedade. Ele também tem artes, business e francês. (Ele poderia ter escolhido economia do lar, música ou marcenaria). E quando ele tiver no senior cycle, que são os três últimos anos, creio que equivalente ao ensino médio no brasil, ele vai ter educação sexual e sobre relacionamentos. Sim, faz parte do currículo.

Além de todas essas coisas legais, ainda tem alguns mimos que eu acho fofos, tipo, eles mandam pelo correio um cartão postal (com artes dos alunos dos anos anteriores) elogiando o desempenho nas atividades, elogiando que ele ajudou o professor tal, elogiando isso e aquilo. Eu acho fofo. E também, se participar do clube dos deveres que tem depois das aulas todos os dias da semana, na sexta feira eles ganham um “chicken roll” na sexta feira, que é basicamente um pão com nuggets.

Ah, quase ia esquecendo que eu amo o tanto que eles estimulam a escrita e a arte de maneira geral. A
escola é cheinha de obras dos alunos que estudaram lá antes. Eu acho muito legal, afinal, o Lipe adora desenhar e ele ta podendo explorar esse dom na escola, e claro que eu adoraria que ele gostasse de escrever do jeito que eu gosto.

Depois de ter esse texto prontinho, teve uma reunião de pais, que eu não posso deixar de compartilhar. Quando cheguei na escola estava o Felipe, oferecendo chá e biscoitos, que os amigos dele estavam servindo. Do outro lado, funcionárias com a lista de professores de cada aluno e alguns alunos entregando canetas. Dentro da biblioteca, os professores sentados em círculo, com placas com seus nomes. Os pais foram de professor em professor, até completar toda a lista, ouvir o que eles tinham pra falar sobre os nossos filhos. Eu achei muito aconchegante. Todo aluno importa pra eles. Na Califórnia, depois que vai pro "middle school" só tem reunião com professores se teu filho causa problemas. Oi?! Ir nessa reunião me trouxe um calor gostoso no coração. Os professores não falaram só das notas do Felipe, eles falaram sobre o Felipe como ser humano, muito além de "é comportado".

Confesso que eu termino esse texto bem feliz. Ultimamente eu venho me perguntando “o que que eu tô fazendo aqui?” e depois de escrever, escrever e escrever… eu já tenho as respostas. Obrigada por me ler até aqui :o)

2 comentários:

  1. Sim!! Também tenho percebido uma grande evolução na educação da Cecília!! Tão diferente do Brasil! Aqui ela aprende matemática... Continua não curtindo muito, mas aprendeu... A respeitar o próximo e a valorizar as habilidades... Só por isso, já temos a certeza de que não fizemos a escolha errada ❤️

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