sexta-feira, 27 de março de 2020

O coração e a razão. Brasil em mim...

Esses dias me peguei deitada em posição fetal ouvindo pagode anos 90. Então levantei pra fazer algo, me olhei no espelho, olhei minha tattoo, meu cabelo, me curti, dancei um pouco, sambei fazendo a casa inteira tremer, quase que literalmente, porque a casa aqui treme a cada passo, imagina com pulinhos de uma pessoa desajeitada tentando sambar.

Fiquei ouvindo pagode uma hora, mais ou menos. Consegui me animar por um tempinho. Logo a angústia voltou e eu só não voltei pra posição fetal porque tinha que dar comida pros meninos, lavar louça, tocar a vida. A música mudou de pagode pra Nando Reis, Marisa Monte, sei lá.. Algo por aí. Acho que uns 99% do tempo que estou acordada e sozinha eu estou ouvindo música, 90% das vezes é música brasileira. Agora revisando o texto, estou ouvindo Ira.. "Eu tentei fugir, não queria me alistar. Eu quero lutar, mas não com essa farda".

Há algumas semanas uma amiga me convidou pra ir num bar que ia tocar MPB. A cantora não era maravilhosa e o repertório não era o meu preferido, mas de alguma forma, me senti em casa. Tenho a mesma sensação quando tomo guaraná ou como coxinha, tipo, essas nem seriam as minhas escolhas se eu tivesse no Brasil, mas quando sinto o sabor, tem gostinho de casa.

Ué? Mas não eras tu que não tinha a menor saudade do Brasil e morria de medo de ter que voltar? Sim, essa era eu. Eu, há um ano, dois, três. Não sou a mesma pessoa que eu era quando comecei a escrever esse blog. Vivi experiências que me transformaram. Muita água passou por baixo da ponte nos últimos três anos. Eu ainda tenho medo de TER que voltar, sem oficialmente ter ESCOLHIDO voltar. E essa foi uma das razões de termos mudado pra Irlanda, porque a situação era muito instável na Califórnia.

Nesses pouco mais de três anos fora do Brasil, eu só tive no Brasil uma vez, por vinte dias, sozinha, onde eu passei a maior parte do tempo dentro da UTI segurando a mão do meu pai e quando eu estava fora do hospital, eu estava angustiada com medo de perdê-lo. Voltei pra Irlanda sem ter visto meu pai acordado e ainda sem ter certeza que ele sairia de lá vivo.

Eu nunca fui pra visitar, passar férias, curtir, ir num show da Dbregas e/ou Dazaranha, comer o polvo no marisqueira de Sintra, tomar um vinho com as amigas ou comer um rodízio de pizza com muita pizza doce. Passei na minha casa só por cinco minutos, depois de ter ido na casa do pai, onde vivi outra experiência muito difícil, a de entrar na casa do pai sem ele lá, e sem ter certeza que ele voltaria. Graças a Deus, voltou :o)

Hoje, a Carolina que sou hoje, as vezes tem vontade de voltar. Tenho vontade de morar no Brasil depois de toda a experiência vivida. Depois de conhecer dois países diferentes, depois de viver culturas diferentes, depois de tudo o que eu aprendi, especialmente, depois de ver na prática que não existe país perfeito. Mas como diz minha psicóloga, isso é um desejo, quando o desejo passa a ser realidade, a gente passa a desejar outra coisa.

Percebi que o desespero de voltar diminui bastante quando tenho contato com o Brasil de alguma forma. Quando encontro brasileiras, que eu converso por horas sobre qualquer coisa, porque a gente simplesmente se entende. E não tem nada como falar o teu idioma, falar, verbalizar. Escrever, eu escrevo todo dia. Seja aqui, seja no meu diário ou no whatsapp. Mas falar.. Nossa.. como é importante pra mim gastar meu estoque de palavras falando meu idioma.

Então é isso.. esse post não tem muita conclusão.. é só meu coração, oscilando entre querer voltar e querer ficar. E assim vamos vivendo, um dia de cada vez... Tentando sempre viver o aqui e o agora, o que está "um pouco" mais difícil em meio a essa pandemia.

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