quarta-feira, 12 de fevereiro de 2020

Quase um ano vivendo sem carro

Uma das coisas que precisamos nos desfazer na Califórnia foi nosso carro. Usávamos o carro pra ir ao mercado que ficava a sete minutos de caminhada de casa. O Felipe ia de patinete pra escola, mas muitas vezes achava uma desculpa pra eu ir buscá-lo no final do dia. A escola do Pablo era um pouco menos acessível, tinha um morro íngreme pra subir e tinha que atravessar a high way one. Mas eu sempre saia atrasada, na confiança por ter a conveniência de fazer as coisas no meu tempo. E eu ainda deixava o Pablo no serviço que a escola oferecia, onde eu deixava ele na porta da escola e tinha alguém pra abrir a porta e cuidar dele dali pra frente. Dirigir sempre foi uma paixão e eu era oficialmente a motorista da família. Diego só dirigia nos passeios de fim de semana. E fazíamos TUDO de carro. 

Por burrice pura, compramos um carro zero e financiamos em cinco anos assim que chegamos na Califórnia. Na hora de nos desfazermos dele, o pesadelo. Devíamos mais do que ele valia, e ninguém queria sequer pagar o que ele valia. Em resumo, morremos com mais de dois mil dólares pra alguém comprar o nosso carro. Emojis de lágrimas de desespero. Hahaha.

Chegando em Dublin, alugamos um carro por um dia porque tínhamos um milhão de malas e precisávamos voltar ao aeroporto em algumas horas pra buscar a Fofinha. Foi desesperador. O Diego que estava dirigindo e eu era o copiloto. Mas socorro. As estradas são super estreitas (especialmente se compararmos aos estados unidos, que é tudo imenso), o volante do outro lado e a mão pra dirigir é do outro lado também. Fazia anos que ele (e eu também) não dirigia carro com câmbio manual, pior ainda, ter que passar a marcha com a mão esquerda. Sobrevivemos. No dia seguinte ele devolveu o carro e foi pro trabalho. Ufa, que alívio.

Já tínhamos meio que decidido na Califórnia mesmo que tentaríamos viver sem carro em Dublin. Chegando aqui, tivemos certeza. O trânsito não é inteligente como era na Califórnia. É meio caótico, na verdade. E o transporte público resolve nossa vida. Não é barato, mas gastamos menos do que gastaríamos se tivéssemos um carro. Tem um aplicativo de aluguel de carro que resolveria nossa vida caso precisássemos de carro de vez em quando, mas nossas carteiras de motorista da Califórnia venceram e hoje nenhum de nós dois pode dirigir. E também nenhum de nós dois teve paciência e energia pra enfrentar o processo pra fazer a carteira de motorista aqui.

Como vivem então? Ué.. com as próprias pernocas, de trem ou de busão. Faça frio ou mais frio ainda, sol, chuva ou neve (é bem raro nevar, mas nevou ontem e bem na hora de levar o Pablo pra escola). Simplesmente nos adaptamos. E nem foi tão difícil assim. Nas primeiras semanas os meninos já aprenderam qual o nosso ônibus, que o mundo não gira ao redor do nosso umbigo e que se não chegar no ponto na hora certa, ferrou, vai ter que esperar o próximo ônibus. Aprendemos a não ter pressa e planejar um pouco melhor o dia a dia.

De vez em quando dá vontade de ter carro? Sim, quando tem alguma coisa pra fazer e o mapa mostra que de carro seria quinze minutos e de ônibus uma hora e ainda tem que pegar dois ônibus. Mas dependendo da situação, pegamos um táxi. 

Infelizmente até hoje não peguei um taxista que eu sentisse que tenha sido honesto comigo. O aplicativo mostra um valor, eles no final da corrida adicionam cinco euros, ou fazem caminhos totalmente diferentes do que o aplicativo mostra e a corrida final sai sempre bem mais cara do que a estimativa. Eu juro que tento dar um voto de confiança e acreditar que conhecem o caminho melhor que eu, mas na maioria das vezes a diferença no valor final é muito grande e alguns não tem nem vergonha de colocar cinco euros no final da corrida assim, na cara dura mesmo. E isso é bem frustrante. E não, aqui não tem alternativa como Uber.

O “problema” maior é levar o Pablo pra escola em dia de chuva, e são vinte minutos de caminhada. Mas também já aprendemos que nesses dias vale a pena sair um pouco mais cedo e pegar o ônibus, a mesma linha que o Lipe pega pra ir pra escola, só que uns minutinhos mais tarde. O horário do ônibus não bate muito com os horários da escola, mas a gente se vira. Ou vai cedo e fica esperando no shopping perto da escola, ou acaba chegando uns minutinhos atrasados, se perdermos o ônibus mais cedo. Odeio chegar atrasada, mas as vezes é o único jeito.

Como moramos perto da linha de trem (menos de dez minutos caminhando), o Diego chega rapidinho no trabalho no centro e optamos por pagar uma taxa mensal pela entrega das compras de mercado em casa, já que o mercado fica perto da escola. De vez em quando penso na possibilidade de comprar um daqueles carrinhos de feira pra ver se me adapto, mas por enquanto não senti tanta necessidade.

Tudo tem se ajeitado e estamos encarando o primeiro inverno sem carro numa boa. As vezes acontece de a chuva despencar bem na hora de ir pra escola e claro que bate aquela dúvida se vale mesmo a pena viver sem carro, mas já estamos há quase um ano caminhando e usando transporte público e tá sendo bem tranquilo. Pra falar a verdade, eu morro de vergonha das distâncias que eu tinha preguiça de fazer caminhando.

2 comentários:

  1. Eu também fiquei um ano sem carro aqui na Alemanha e sobrevivi. Claro que eu nao tenho dois filhos e isso fica tudo diferente, mas a gente sente na pele a diferença que isso faz no nosso cotidiano. Adorei te ler Carol, que a inspiraçao nao te falte e que vc faça post toda semana!! Beijoss

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  2. Hahaha gostei! Eu tô no desespero por ter um carro aqui, mas Tb conseguimos ficar um ano sem e com certeza isso mudou meu modo de pensar... Se eu tiver um carro, com certeza agirei diferente de quando tinha carro no Brasil!

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