quarta-feira, 24 de janeiro de 2018

Escolas, educação e o que observo por aqui: Parte 2

Então a vida na escola nova começou. De cara já me pareceu bem mais organizada que a primeira, afinal, perceberam super rápido que o Pablo não ia se dar bem no segundo ano e tomaram as atitudes necessárias pra evitar problemas futuros. No dia da inscrição eu perguntei se poderia voluntariar na secretaria, porque eu não me imaginava em sala de aula. A secretária adorou a idéia, porque ela precisava mesmo de ajuda e ninguém nunca tinha se oferecido antes.

Também descobri, conversando com uma mãe, que voluntariar na sala de aula não tem muito a ver
com estar com as crianças, que meu trabalho seria tirar cópias, cortar coisas e fazer aquelas coisas que toda professora tem que fazer, mas que precisa de tempo, sendo assim, e considerando que "quase nem gosto" de mexer com papel, me ofereci pra voluntariar na sala do Lipe e na sala do Pablo.

A presença dos pais na escola é muito valorizada. Mesmo pais que trabalham full time, conseguem um jeitinho de ajudar a escola de alguma maneira, nem que seja nos eventos. Eu amo, me sinto útil e realmente adoro brincar de cortar coisa, tirar cópias, fazer serviço que nos dez anos de Celesc sempre passei pro estagiário, mas que no fundo, eu que queria fazer. Mas também adoro ajudar nos eventos pra arrecadar dinheiro pra escola ou as festas das turmas que precisam de pais pra dar uma mãozinha.

Meu trabalho na secretaria não durou muito, porque logo na segunda semana a Mrs. Cristine ganhou uma ajudante oficial. Mas toda quarta feira eu ajudo a Mrs. Meyers na biblioteca da escola do Pablo, colocando livros na prateleira e no momento tô focada em colocar um adesivo com a letra do nível de leitura em cada livro. Cada um dos tantos mil livros se enquadra num nível de leitura, de A a Z e eu vou ter que colocar adesivo em todos (não acaba nunca). O Pablo tá lendo nível I e o Lipe não sei dizer exatamente, mas ele já lê Harry Potter, que é nível V.

Pra ajudar na sala do Lipe eu basicamente tiro cópias. A criança aqui ficou impressionada com a máquina que grampeia e fura o papel sozinha, hahahahhahah. Não entro na sala do Lipe, a professora sempre me da meu trabalho do lado de fora. Então não tenho muita vivência além do que o Lipe traz pra casa. Consigo espiar que eles não sentam em fileiras, mas sim em grupo, como nos filmes. 

Na primeira semana de aula o Lipe teve que "aplicar" pra um "emprego", onde ele podia escolher ser o limpador do quadro, o telefonista, o abridor de porta, o banqueiro, o fiscal de deveres, fiscal de presença, entre outros. Ele teve que fazer currículo, portfólio e esperar uma semana pra ver se seria selecionado pra vaga escolhida. Toda criança tem um "emprego" e recebem salário (na moeda da turma, claro, que se chama "Dent Dollar") e tem que pagar pela sua cadeira todo mês. Se economizar, consegue comprar a cadeira e só paga imposto por ter a cadeira, mas não paga mais aluguel. Eles também pagam multa se fizerem coisa errada, ganham dinheiro extra se fizerem coisas boas e de vez em quando tem leilão com um monte de bugigangas pra eles comprarem as coisas que quiserem com seu dinheiro. Tudo isso em "Dent Dollar". Acho a idéia simplesmente brilhante. Ensinando desde cedo a cuidar do dinheiro e ter responsabilidades.

Outra coisa que me chamou a atenção foi que o Lipe tinha um parceiro de leitura no nível dele (teoricamente, porque ele foi colocado com um Canadense que só falava Francês, e a professora achava que eles estavam no mesmo nível, mas não estavam). Ele tinha que ler um certo número de páginas de um livro e o amigo também, e eles deveriam conversar a respeito no dia seguinte. Isso fez o Lipe resgatar o gosto pela leitura e eu só agradeço.

Outra coisa que observo e gosto muito é que diferente das escolas que ele teve no Brasil, aqui eles são instigados a pensar. As respostas não são prontas. As crianças são ensinadas a pesquisar as respostas pras perguntas, que eles também são incentivados a criar. Eles ensinam matemática de um jeito diferente, sem respostas necessariamente exatas, por mais estranho que possa parecer. Não vejo mais o Lipe decorando coisas, vejo ele entendendo o que tá aprendendo e isso pra mim, já fez a loucura da mudança valer a pena.

Já na sala do Pablo eu fico por duas horas toda sexta-feira, e lá dentro, vendo tudo acontecer. Lá eu corto papel, nossa, quanta coisa que tem pra cortar. A parte da pedagogia que eu sempre gostei, de fazer aquelas coisinhas fofas que só professoras fazem, bom, aqui são as mães voluntárias que fazem. Todo dia da semana tem uma, de tanta coisa que tem pra fazer. Não sei como seria possível sem a ajuda das mães. Aliás, simplesmente não seria possível.

A estrutura da sala de aula, mesmo que seja pública e bem inferior as particulares (pelo que a professora me contou), é algo que eu nunca tinha visto na vida. Tem mini biblioteca, cantinho da matemática, projetor, microfone pra professora, computador e tablet pra metade dos alunos (numa escola particular tem pra todos), pia pra lavar a mão, telefone, apontador de lápis automático, cortador de papel, estante pra secar trabalhinhos de artes, etc. Nunca entrei em sala de aula no Brasil que não fossem as que eu estudei, mas na escola que eu estudava, tinha um projetor pra escola inteira, assim como a maioria dos materiais que citei. Tudo bem que faz 17 anos que sai da escola e hoje as coisas devem ser diferentes, mas fiquei impressionada.

Todas as manhãs as professoras conferem se todos os alunos estão na sala, quem vai comer comida da cafeteria e comunica a secretaria (se ela esquece, a secretária chama ela no alto falante da sala e lembra). Aqui a presença é levada muito a sério e se chegar atrasado também, tudo controlado e vem escrito no report card (tipo um boletim). Se a criança não está na escola e os pais não avisaram que ele não estaria, os pais vão receber uma ligação informando. Isso me dá muita segurança em deixar o Felipe ir de patinete pra escola.

Sempre tem alguém dentro da sala, ou um pai que está ajudando, ou alguns funcionários que dão esse tipo de suporte, enfim, a professora quase nunca fica sozinha nas turmas iniciais. É muito interessante. Eu fico fascinada de estar dentro desse universo e vendo como tudo funciona. 

O Pablo sai da escola todo dia dizendo que foi muito legal e eu consigo entender porque. É tudo muito dinâmico, as atividades são rápidas, não dá tempo de ficar entediado. O aprendizado não é através de brincadeiras, mas é leve e gostoso. Toda semana uma criança é o cientista da semana e eles fazem experiências super simples e eu tenho a sorte de acompanhar quase todas, pois geralmente são nas sextas-feiras bem cedo. O cientista fica muito feliz, se sentindo importante, e as crianças que assistem, sempre ficam impressionadas com as descobertas. É muito fofo.

Eles ficam na escola das 08:15/08:30 as 14:49/14:35, almoçam na escola a comida que eu mando na marmita, o Pablo gosta de comer na cafeteria de vez em quando, eu deixo ele escolher dois dias da semana. Normalmente ele gosta de comer pizza, nuggets, mac and cheese ou cheeseburger, sim, é isso mesmo que servem na escola. Mesmo que eles coloquem os vegetais ali junto pra disfarçar, creio que a maioria das crianças jogue os vegetais fora. Por isso só permitimos duas vezes na semana. O Lipe só come na cafeteria quando é Emoji Fries e Nuggets.

Outra coisa que a gente vê nos filmes e que é real são os treinamentos pra terremotos, fogo e outras situações de perigo. Eles são muito frequentes, o que realmente é bom, porque se realmente acontecer, as crianças estão preparadas. Eu já passei por dois, um de lock down (quando vem um maluco atirando na escola ou outra situação parecida) e um de terremoto. Não interessa se eu sou só uma voluntária de passagem, preciso participar do treinamento. 

No dia do treinamento de lock down, eu tava na escola do Lipe e tive que ir pra baixo da carteira com ele. No dia do treinamento de terremoto eu entrei em pânico, mesmo sabendo que teria um treinamento. Eu estava na escola do Pablo, mas na biblioteca, com uma turma de pré. Tive que ir pra baixo da mesa junto com as crianças, lembrar elas de protegerem o pescoço e depois fomos caminhando até o pátio, onde os pais vão buscar as crianças depois, em casos de terremoto real. Foi tenso, mas é importante ter, pras crianças não pirarem igual eu pirei só no treinamento.

Sei que escrevi demais, mas é tanta emoção e tanta coisa pra contar, que fica difícil selecionar. Eu acho realmente que a nossa loucura valeu a pena, mesmo que fosse só pela experiência com a educação. Provavelmente esqueci de falar de um monte de coisa legal. Mas vou anotando e quem sabe, ainda caiba mais um post.

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