quarta-feira, 13 de setembro de 2017

Feminista e dependente financeiramente do marido, como fica?

Bom, esse post é um dos que eu estou mais enrolando pra escrever. É punk pra mim, é difícil pra caramba, mas vamos ver como ele flui. Lá nos meus quinze anos eu comecei a "ficar" com o Diego. Um mês depois, meus pais se separaram. Antes (e depois) da separação eu presenciei muitas brigas bem feias por causa de dinheiro. Minha mãe era dona de casa por opção e o único provedor era meu pai. Sempre presenciei muito controle sobre os gastos. Presenciei a obrigação da minha mãe de mostrar onde foi gasto cada centavo enquanto ela nunca soube quanto meu pai ganhava e onde gastava. Muito controle, muita briga, mais gastos, mais brigas... e o eu tinha o exemplo exato de como eu queria que meu relacionamento NÃO fosse.

Claro que naquela época (foto esquerda) eu e o Diego não tínhamos idéia, apesar dos sonhos, de que ficaríamos juntos tanto tempo. Mas desde o início nossa vida financeira foi aberta e sem divisões. Fui professora de inglês aos 16 anos e o Diego fazia estágio da escola técnica. Eu ganhava R$120,00 e ele R$100,00. Nós guardávamos R$100,00 e vivíamos com o restante. Claro que nessa fase morávamos com nossos pais e não tínhamos que pagar nada além de alguma roupa nova ou a pizza que saíamos pra comer. Desde aquela época, nunca dividimos uma conta. Nunca foi meio a meio. Nunca. O dinheiro sempre foi nosso. Mesmo quando éramos dois pirralhos adolescentes ganhando uma merreca.

O salário dele foi crescendo, eu pulava de emprego em emprego por pura imaturidade, mas o dinheiro sempre foi nosso. Ele foi morar sozinho, mas eu sempre tive acesso a senha da conta dele, sempre fizemos as contas juntos, enfim, era assim que vivíamos. Passei no concurso da Celesc e casamos. O salário dele era maior, mas eu tinha o vale alimentação, plano de saúde e isso equiparava. Esperávamos entrar o vale pra fazer compras, esperávamos entrar o salário dele pra pagar as contas maiores (as menores normalmente já tinham sido pagas com meu salário).

Nunca dividimos. Nunca foi "eu pago o carro, tu paga a casa, eu pago a luz, tu paga a água". Nunca! Sempre foi "a conta que vence primeiro é paga com o salário que entra primeiro" e assim a vida segue. O salário dele sempre foi maior e o meu sempre foi a segurança e a estabilidade na nossa vida. Ele viajava muito a trabalho e nenhum de nós estava feliz com aquela situação. Eu já tinha pedido pra ele pedir demissão trinta mil vezes, mas faltava coragem. 

Um belo dia, a empresa avisou que ele teria que viajar no dia seguinte, sem nenhum planejamento. O Pablo era bebezinho, era uma situação chata, ele ficava sempre mais de um mês longe e morávamos longe das avós, ou seja, não tinha apoio por perto pra cuidar da criançada. Por um empurrãozinho do universo ele perdeu o vôo. Ele aproveitou, foi até a matriz e pediu demissão. Tínhamos a segurança do meu emprego. Ele queria começar a trabalhar com TI e assim foi. Por uma sorte do destino, na mesma semana ele recebeu a proposta de uma empresa que ele fazia freelances pra trabalhar em tempo integral. Perfeito. O salário ia ficar um pouco menor, mas sem as viagens.

Mas a vida não era só flores. Faltava diálogo, faltava mesmo o diálogo. E além do diálogo, faltou grana, porque aquela nova empresa ficou dois meses sem pagar. E nesses dois meses vivi um inferno. Digo vivi, porque o Diego nem fazia idéia do que eu tava passando, afinal, eu não falava, esperava que ele advinhasse, tivesse um feeling, sei lá, hahahahahahahhaha ha ha. Não tínhamos dinheiro pra pagar faxineira (e várias outras coisas) e eu queria que o Diego desse jeito na casa, afinal, ele estava o dia inteiro dentro de casa. Eu não entendia que ele estava trabalhando (sem receber, mas estava) e ele não sabia o que eu esperava dele: cooperação. Éramos imaturos, o modelo machista ainda sobressaia, onde eu achava que eu, por ser mulher, tinha que dar conta dos filhos e da casa, além das oito horas de trabalho fora e ele, claro, também se aproveitava da situação.

Eu me achava uma coitada por ter um marido que não "ajudava em casa", achava que precisava dele pra viver e que não tinha escolha. Eu achava que a solução era o divórcio, mas acreditava que não poderia me bancar (assunto pra outro post). Enfim, os pagamentos atrasados entraram, a situação financeira começou a melhorar e muito dali pra frente. O relacionamento não melhorou na mesma proporção. Continuávamos no mesmo esquema financeiro, salário que entra primeiro, paga a conta que vence primeiro e assim funcionava.

Trocamos de carro, trocamos de apartamento e exatamente dez meses depois, trocamos de cidade. Fizemos algumas escolhas beeeem erradas por falta de diálogo, quase nos separamos de verdade, construimos nossa casa e reconstruimos nossa relação. Muita terapia e entendimento sobre mim mesma. Entendi que estou com ele por escolha e não porque preciso dele e isso mudou tudo. Me encontrei no feminismo e a medida que eu ia me transformando, eu fui sentindo mudanças no Diego. Crescemos juntos. Amadurecemos juntos.

O diálogo foi surgindo naturalmente com o amadurecimento. Tudo foi ficando mais claro, aprendemos cada vez mais um sobre o outro e sobre nós mesmos. Mas eu ainda não tinha coragem de sair do meu emprego e depender totalmente dele. Eu queria ser doula, mas eu tinha o "sonho de todo mundo" nas mãos, eu tinha a história da minha mãe, eu tinha o medo. Tinha a cobrança da sociedade, tinha tanta coisa.

Mas... Mas... Maaaaaaaaasssss... ser dona de casa e depender do marido fora do país pode, né? Daí é tudo lindo, tudo beleza. Quando comentava com algumas pessoas que sairia da Celesc pra trabalhar como doula era a maior loucura do planeta: "sua louca, jogar um emprego maravilhoso fora e depender do marido?". Mas quando eu comentava que mudaria de país, aí é só alegria, ninguém em nenhum momento perguntou se eu iria trabalhar ou sei lá.

Pois é, minha gente, cá estou. Na California, sem permissão de trabalho e dependendo totalmente do marido financeiramente. E como foi isso? No começo uma bosta. Horrível, eu me sentia péssima, inútil, achava que devia explicações pra tudo, achava que a obrigação de manter a casa e os filhos em ordem era unicamente minha, afinal, eu não tô botando dinheiro dentro de casa.

Passamos por alguns apertos financeiros e isso piorou bastante meu sentimento, minha sensação de
impotência. Mas com o tempo a poeira foi baixando, fui lembrando que somos uma equipe e que tomamos essa decisão juntos. Que não seria possível de outra maneira, pelo menos nesse primeiro momento. Que sabíamos que seria assim e que nada mudou. O dinheiro continua sendo nosso e em nenhum momento precisei justificar onde gastei algum dólar. Claro que somos adultos e sabemos exatamente onde e quando podemos gastar. Mas basicamente hoje eu nem me lembro mais que não "coloco dinheiro dentro de casa".

Sinto falta de trabalhar, de produzir, de ver gente. Mas isso vai ser resolvido logo logo quando eu começar a voluntariar. Sinto falta de ter "meu dinheiro"? Não, não sinto. Continuamos tendo o nosso dinheiro e eu não preciso pedir autorização pra comprar uma calcinha ou fazer depilação, como muita mulher relata. Custei a me adaptar a essa nova realidade, foi preciso bastante terapia e auto conhecimento. Mas hoje estou em paz. O dinheiro que ganhamos é suficiente pra termos uma vida ótima, minimalista, sem luxos, exatamente como precisamos. Se o universo me oferecer uma oportunidade quando eu tiver permissão de trabalho por aqui, vamos analisar juntos se vale a pena. :)

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